Diário da Manhã - Opinião - Dia 03/12/2009


No último dia 19 de novembro ocorreram as eleições para a próxima diretoria da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção de Goiás, no triênio 2010/2012. As eleições da entidade, que é a mais respeitada da sociedade civil e com amplo trânsito e diálogo com os poderes constituídos, ganharam as ruas de Goiânia e das principais cidades do interior, pois há aproximadamente 20 mil advogados inscritos, fora vários estagiários e demais operadores do Direito que acompanharam atenciosamente as eleições da advocacia.

O processo eleitoral vigente é radicalmente oposto à tradição democrática que marca a Ordem dos Advogados do Brasil. Inicialmente, em uma categoria que está presente em dezenas de comarcas em todo o Estado, que se salienta, é detentor de considerável dimensão territorial, o prazo de inscrição de chapas e de campanha é ínfimo, o que dificulta às chapas de chegarem ao advogado para apresentar suas propostas, o que torna o processo desconhecido para muitos colegas, pois o cadastro geral dos advogados só é entregue após a homologação das chapas regularmente inscritas.

Não apenas o exíguo período eleitoral defenestra os espíritos democráticos dentro da Ordem dos Advogados do Brasil, mas as notícias lamentáveis que se tornaram corriqueiras em todos os processos eleitorais recentes. O pagamento de anuidades no dia das eleições macula de tal forma a categoria, que já é vítima de uma série de bazófias cotidianas com o triste silêncio omissivo da direção da seccional.

Observe que o pagamento de anuidades no dia das eleições - estima-se que 1.000 foram pagas nos dias antecedentes - é algo incompatível à moral, pois se não a pagou por anos para exercer sua própria profissão (o advogado inadimplente fica suspenso da advocacia), por qual razão as pagaria no dia das eleições? Ou mais diretamente, qual o interesse de quem está pagando essas anuidades? Certamente não é o de ajudar um advogado carente.

Há fortes indícios, ainda mais pelo que circula no "boca a-boca" diário dos corredores forenses, de que a compra de votos se tornou prática corrente nas eleições da entidade, e ela ocorre porque não há definição prévia dos eleitores na OAB. Pagar anuidade no dia da eleição e transferir o domicílio com menos de 30 dias antes são práticas comuns e que infelizmente não são contestadas porque não há esforço dos dirigentes da entidade em mudar seu próprio regramento eleitoral, que só acontecerá se a própria categoria mobilizar os nossos parlamentares para alteração da Lei 8.906/1994 - Estatuto da Advocacia.

Infelizmente, no meio de tamanho desrespeito não apenas à advocacia, mas a todas as instituições democráticas, é necessária a intervenção da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, pois não há mecanismos administrativos para apurar e moralizar a entidade - assim como não houve até hoje uma investigação interna no escândalo do Exame de Ordem. Por muito menos, foram cassados os governadores do Tocantins, Maranhão, e agora deverá cair o do Distrito Federal.

Indícios não faltam, mas é necessário investigá-los, inclusive sabendo quem "pagou" as anuidades nos dias antecedentes ao das eleições, e quais as formas de pagamento? Dinheiro, cheque, cartão? Cheque e cartão de quem? É verdade que houve 400 anuidades pagas com apenas um cartão? Só investigação oficial e externa pode elucidar tais questionamentos.

O regramento eleitoral da OAB é tão esdrúxulo que, no caso de Goiás, a chapa vencedora teve o voto de apenas 27% dos advogados aptos a votar. O número de abstenções é superior ao número de votos da chapa vencedora, e se considerarmos apenas os votos válidos, 60% dos advogados são contra o que está posto há 20 anos pelo mesmo grupo. E se há 20 anos ocorre tal continuísmo, provavelmente não haverá empenho dos próximos dirigentes da seccional para moralizar as eleições classistas.

No meio desse deboche, as eleições da OAB, que deveriam ser exemplo de moralidade, transparência e ética, sofrem com mazelas piores que a do processo eleitoral convencional, pois é até compreensível, embora repudiado, quando um analfabeto, passando as piores necessidades alimentares, venda seu voto por botinas ou enxadas; mas o advogado, que tem necessária formação superior no curso mais tradicional do Brasil, vender seu voto por uma anuidade... Tanto "comprador" como "vendedor" são indignos de se apresentarem como advogados, que de Santo Ivo a Rui Barbosa deram imensas contribuições aos princípios éticos e morais da advocacia.

Resta esperar a boa vontade de outras seccionais onde a oposição tenha vencido, pois somente quem se opõe ao continuísmo irá ter coragem de promover a mudança necessária no regramento eleitoral, com a implantação do sistema proporcional ou da decisão em segundo turno com a manutenção do sistema majoritário, e moralizar a Ordem. Ou então, a anuidade continua valendo um voto.

 

Fernando Jorge Silva é advogado