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Estudo feito pela pesquisadora Patricia Rangel, tendo como base os dados das eleições municipais de 2008, mostra que a participação feminina na vida política institucional pouco evoluiu em quatro anos. No que diz respeito às prefeituras, houve um tímido crescimento de candidaturas femininas entre 2004 e 2008, passando de 9,5% do total para 11,2% no ano passado. Já nas candidaturas a vereador, ocorreu um decréscimo, com a participação das mulheres passando de 22,1% para 21,5% do total de candidatos. O percentual de prefeitas e vereadoras eleitas também indica estabilidade, consolidando uma baixa representação.

 
Hoje, segundo dados da ONG Inter-Parliamentary Union, o Brasil ocupa uma desconfortável 142ª posição entre 188 países com participação feminina na política. Tal quadro evidencia a inadequação da atual legislação eleitoral e do sistema brasileiro e que dificulta a inserção das mulheres na vida política institucional. Apesar da existência de cotas de 30% para as eleições proporcionais, dificilmente essa determinação é cumprida, não havendo punição para as agremiações políticas que desrespeitam a lei.

 
“Hoje, a cota de 30% se aplica na chapa e se não preencher, ele não sofre nenhuma sanção. E, mesmo quando a mulher se propõe a se candidatar, ela não tem os meios para se igualar numa campanha política. O que mostra que a cota é uma conquista formal que tem que ter celebrada, mas cada partido deveria destinar uma quantia de seu recurso do fundo partidário para as mulheres”, avalia a deputada federal pelo PSB-SP, Luiza Erundina. Na prática, o sistema de cotas como o que existe no Brasil já foi capaz de proporcionar avanços significativos em alguns países. Na Costa Rica, por exemplo, em 1999 houve uma reforma na legislação eleitoral que obrigou os partidos a respeitarem uma cota de 40% de mulheres. A diferença em relação ao Brasil é que o desrespeito à lei poderia resultar até mesmo na perda de registro do partido político. Foi assim que o percentual de mulheres no Congresso costa-riquenho passou de 19% em 1998 para 39% em 2006.

 
Por conta disso, a efetivação do sistema de cotas é entendida por muitos movimentos ligados a mulheres como ponto essencial na reforma política, o que passa também pela adoção do sistema de listas fechadas. “A reforma política ajudará a luta por espaço na política formal, mas não vai solucionar o problema. Tem que se pensar que, se continuar com as listas abertas, é preciso que se tenha uma legislação de cotas que preveja sanções. Se houver a aprovação da lista fechada, o correto é que se tenha uma alternância entre um homem e uma mulher, um homem e outra mulher etc.”, sustenta Sônia Malheiros, subsecretária de Articulação Institucional do Ministério de Políticas para as Mulheres. “Dessa maneira, claro que vamos assegurar o aumento de mulheres na política, mas entendemos que a questão não se resolverá apenas por essa legislação, já que existe um problema cultural”, completa.

 
A inserção feminina também passa por outro ponto da reforma: o financiamento de campanha. Hoje, na lista dos maiores doadores em campanhas eleitorais estão empresas e grupos que são controlados por homens, o que se torna uma dificuldade a mais para a obtenção de fundos para as candidatas mulheres. “Queremos que 30% dos recursos sejam destinados aos órgãos representativos das mulheres no partido. Hoje, elas não têm condições financeiras de organizar seminários e também de se capacitar e formar politicamente”, argumenta Erundina. “Hoje, as mulheres não têm condições efetivas para se eleger. Às vezes nem a amiga sabe que ela é candidata, porque não tem dinheiro sequer para o material de campanha”, conta Muna Zeyn, coordenadora do comitê multipartidário da mulher do estado de São Paulo.

 
Por conta disso, o financiamento público de campanha é uma medida que pode beneficiar e tornar menos desigual a disputa por espaços na política institucional entre homens e mulheres. “As mulheres não estão nos grandes esquemas financeiros, por isso uma candidatura que conta com o financiamento privado de campanha tem menos mulheres. Uma reforma política que contemple o financiamento público de campanha constituiria uma medida com forte viés feminino”, acredita Fátima Pacheco Jordão, do Instituto Patricia Galvão. “As redes partidárias ficam muito corporativas, ligadas ao clientelismo, com o financiamento privado. O financiamento público dá condições a homens e mulheres se candidatarem em condições iguais”, sustenta.
 
 A conquista de outros espaços
 Não é somente na política que as mulheres enfrentam dificuldades de inserção. Em outros setores da sociedade civil, como os movimentos sociais e no meio sindical, também a representatividade feminina ainda é baixa, embora algumas lideranças já consigam se destacar pela sua atuação.

 
“São vários fatores que impedem a maior inserção feminina no movimento sindical, porém ressalto, em primeiro lugar, a cultura machista, ainda arraigada nos homens e em algumas mulheres”, destaca Arlene Montanari, secretária de Políticas Sociais da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT). “A caracterização da mulher como a única responsável pelo lar e criação dos filhos também tira dela a disponibilidade de participação em cursos, congressos, movimentos de massa – que normalmente exigem que se esteja disponível de madrugada, sem hora para voltar para casa”, reflete.

 
Se, no meio sindical em geral, a participação feminina encontra muitas barreiras, em categorias predominantemente masculinas como a dos metalúrgicos, a situação pode ser mais difícil. Mesmo assim, há conquistas para se comemorar. “Há tempos, na metalurgia, víamos que as mulheres estavam relegadas aos trabalhos mais delicados, mas hoje já as encontramos como ferramenteiras e torneiras-mecânicas”, explica Mônica Veloso, secretária-geral do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco e Região e também a primeira mulher a presidir o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). “Isso mostra que o próprio setor passou a enxergar a mulher como alguém que tem um perfil qualificado, mais escolaridade e capacidade de trabalhar em grupo. E isso começa a se refletir nos espaços de representação”, argumenta.

 
Ainda que tenha havido uma mudança na composição das funções e na base de mobilização da categoria, Mônica Veloso destaca que é preciso avançar também na representação da direção dos sindicatos. “Dos nossos 28 diretores sindicais, apenas quatro são mulheres, mas acho que também nesse sentido o espaço feminino não pode ser dado, tem que ser conquistado. Por outro lado, o sindicato também deve trabalhar com a diversidade para que todos os trabalhadores entendam que lá eles podem contribuir para a luta e crescer, apesar de todas as dificuldades”, defende.

 
A voz aguda e as cantadas
 Lucia Stumpf foi apenas a quarta presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) e, para ela, as dificuldades da participação feminina no movimento de estudantes hoje refletem o machismo que há no restante da sociedade. “Na universidade, hoje, muitas mulheres entram como chefes de famílias, o que diminui as possibilidades de se entrar na militância estudantil”, explica. Essa condição também prejudica a obtenção de bolsas de graduação e pós-graduação. “Como muitas delas exigem dedicação integral, as mulheres têm maior dificuldade para consegui-las”, explica.

Mas existem outros obstáculos que fazem que muitas mulheres desistam de participar da militância. “A mulher está sempre sujeita a ouvir gracejos de homens que acham que estão agradando e, na verdade, estão constrangendo”, conta Stumpf, que acrescenta: “Quando você está em uma passeata e de repente se escuta uma voz feminina, as pessoas estranham porque esperam que uma voz de comando seja grave. Também por isso, a mulher tem que se colocar de outra forma, não se impor pelo timbre da voz ou pelo tipo físico, e a opção não é se masculinizar, mas sim afirmar ainda mais sua feminilidade. As mulheres, em nossa cultura, são criadas para o consenso, os homens são orientados para brigar, para subjugar. Por isso elas conseguem criar mais espaços de diálogo do que o homem”.

A presidente da UNE toca em um ponto polêmico: para participar da política ou de espaços que são dominados pelo homem, a mulher tende a se assemelhar ao modo de agir masculino ou consegue se inserir de forma original? “Acho que já se foi o tempo em que as mulheres se portavam como homens. Hoje elas viram que existe um jeito próprio de fazer política e, com isso, fazem a diferença”, argumenta a senadora Serys Slhessarenko (PT). “As mulheres querem fazer política de maneira diferente. Com transparência, de modo participativo, de maneira que a coletividade decida e não que uns decidam para a coisa acontecer. E a comunidade sabe que a mulher é assim”, sustenta Muna Zeyn.

Enquanto a luta pela igualdade de gênero segue, hoje muitos movimentos entendem que um dos principais pontos é envolver também os homens nesse debate. “Quando ambos incorporarem a luta e agirem em conjunto, em pouco tempo a igualdade se dará”, acredita Arlene Montanari. “A questão da igualdade não pode ser apenas de homens ou de mulheres. É importante que todos entendam que diz respeito à democracia. Precisamos que homens também encampem a igualdade para fazermos um país mais democrático em todos os sentidos”, vaticina Fátima Pacheco Jordão.

Fonte: Revista Forum

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